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A Igreja apoiou a escravidão?


Não é incomum que nós católicos ouçamos diversas acusações contra a Igreja Católica a respeito da escravidão. Uma das afirmações mais comuns é de que existe uma bula papal, no caso a Dum diversas (1452) do papa Nicolau V, que daria embasamento e razão à causa da escravidão. O fato é que mesmo sendo uma grande falácia, muitas pessoas, inclusive católicos, acreditam nessa estória.

Para desfazer essa mentira vamos compreender um pouco do contexto da época em que a bula foi escrita, a Idade Média. Os sarracenos (muçulmanos) estavam a vários séculos atacando, saqueando, perseguindo, matando europeus, além de estuprarem, capturarem e venderem mulheres e crianças europeias para servirem de escravos sexuais em haréns. Além disso, a cidade de Constantinopla estava sob ameaça de ataque. Durante esse período, várias ordens, como a dos Trinitários e dos Mercedários foram fundadas com o intuito de libertar os escravizados cristãos. Diante da situação caótica, o papa autorizou o Rei Afonso V de Portugal a prender sarracenos que repetidamente atacavam e escravizavam os europeus:

“[...] nós lhe concedemos por estes presentes documentos, com nossa Autoridade Apostólica, plena e livre permissão para invadir, capturar e subjugar os sarracenos e pagãos e quaisquer outros incrédulos e inimigos de Cristo [...] e reduzir suas pessoas à perpétua escravidão.”

A situação claramente se encaixa e no conceito de guerra justa e no direito de legítima defesa, amparados pelo Catecismo da Igreja Católica para que assim essa situação tivesse fim. Os mouros (mulçumanos) eram perseguidores da Igreja a séculos e o que recebiam dos cristãos não era senão a justa resposta por suas atrocidades. E após o fim da Idade Média, seus atos não se encerraram: Robert Davis, professor de história da Universidade de Ohio afirma que entre 1500 e 1800, mais um milhão de europeus foram escravizados por muçulmanos.

Entenda que na bula em momento algum é mencionado que os sarracenos (que não eram necessariamente negros) não tem alma, pelo contrário, a bula menciona a necessidade de promover a conversão dos sarracenos e pagãos.

Conhecida a situação, vamos a segunda parte: a Igreja se posicionava contra a escravidão. Diversos documentos, na época escravagista do Brasil já haviam sido

publicados contra a escravidão de qualquer ser humano, ou seja, brancos, negros, indígenas e etc. Papa Paulo III publicou em 1537 a bula Veritas ipsa, condenando a escravidão de indígenas e todas as demais gentes, mesmo não cristãos:

“[...] declaramos, que os ditos Índios, e todas as demais gentes que daqui em diante vierem à notícia dos Cristãos, ainda que estejam fora da Fé de Cristo, não estão privados, nem devem sê-lo, de sua liberdade, nem do domínio de seus bens, e que não devem ser reduzidos à servidão.”

Veja uma lista de documentos importantes que contemplam a questão da escravidão listados pelo professor medievalista Ricardo Costa:

  • Sicut Dudum (1435) de Eugênio IV: manda libertar escravos das Ilhas Canárias;

  • Pio II instrui bispos a pregarem contra o tratamento de negros etíopes (1462);

  • Sublimus Dei (1537) de Paulo III: recorda da livre natureza dos indígenas;

  • Tomás de Mercado, dominicano, declara a desumanidade da escravidão (1571);

  • Cum Sicuti (1591) de Gregório XIV: condena a escravidão;

  • Commissum nobis (1639) de Urbano VIII: condena a escravidão.

Sabendo que a Igreja se posicionava contra a escravidão, entendamos agora que a Igreja não podia simplesmente fazer valer sua posição. Dentre de seus limites eles ensinavam que os escravos não podiam ser maltratados e deveriam frequentar as missas e receber os sacramentos. Isso porque a Igreja estava sujeita ao poder da coroa portuguesa na época do Brasil Colônia e consequentemente, o poder de fazer valer as determinações papais contra a escravidão não era suficiente para que os portugueses obedecessem. Se os sacerdotes se rebelassem contra os senhores de escravos, seriam certamente expulsos da colônia. O padre Antônio Vieira ousou ainda mais condenando abertamente a escravidão:

“Nas outras terras, do que aram os homens e do que fiam e tecem mulheres se fazem os comércios: naquela (na África) o que geram os pais e o que criam a seus peitos as mães, é o que se vende e compra. Oh! Trato desumano, em que a mercância são homens! Oh! mercância diabólica, em que os interesses se tiram das almas alheias e os ricos são das próprias!"

A acusação contra a Igreja de que os negros não tinham alma é completamente infundada, pois se assim fosse, eles não poderiam ser batizados, casar e receber a sagrada comunhão. Outro fato curioso é que os negros recebiam autorização da Igreja para fundar suas próprias comunidades e construir capelas e igrejas.

Apenas por curiosidade: o iluminista Voltaire, intelectual “defensor da liberdade” e dos direitos humanos publicamente, tinha uma boa vida graças aos lucros que obtinha a partir do tráfico de escravos negros.

Por hoje é isso, a paz de Cristo e o amor de Maria Santíssima!


FONTE: Alexandre Varela e Viviane Varela, As grandes mentiras sobre a Igreja Católica – Desvende os mitos sobre o catolicismo, 1 ed. São Paulo: Editora Planeta, 2016, pp. 191-195.


FONTES PARA APROFUNDAMENTO:

  • BALMES, Jaime. A Igreja Católica em face da escravidão.

  • CARROL, Rory. New book reopens old arguments about slave raids on Europe. The Guardian, 11 mar. 2004. Disponível em: <www.theguardian.com/uk/2004/mar/11/highereducation.books>.

  • COSTA, Ricardo. A Igreja Católica e a escravidão. Gazeta do Povo, 2 fev. 2013. Disponível em: <www.gazetadopovo.com.br/opiniao/artigos/a-igreja-catolica-e-a-escravidao-eigkj4jarnd3xrpaps5rmhj8s>.

  • GLAZOV, Jamie. The Study of Political Islam. Disponível em: <http://archive.frontpagemag.com/readArticle.aspx?ARTID=297>.

  • Sermão XIV em Sermões, vol. IX, Ed. das Américas, 1958, p. 64

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